Empreendedorismo
Social: Pequena revisão da Literatura
Social Entrepreneurship: Brief Review of the
Literature
Ruben
Amorim
Técnico
Superior de Educação Social
Portugal
Resumo
O propósito deste artigo é realizar uma pequena
revisão da literatura de modo a definir o conceito de empreendedorismo social e
o empreendedor/a social, a sua emergência e as diferenças para com o
empreendedorismo comercial.
Ao longo do artigo é possível perceber que o
conceito de empreendedorismo social encontra-se muito mal definido e que
existem várias perspetivas em torno do mesmo.
Palavras-chave: empreendedorismo social, empreendedor/a social,
transformação social e inovação.
Abstract
The purpose of this article is a brief review of the literature to define the concept of social entrepreneurship and the social
entrepreneur, its emergence and
differences in entrepreneurship
for business.
Throughout the article you can see that the concept of social entrepreneurship is poorly defined and there are several perspectives about the same.
Keywords: social entrepreneurship, social entrepreneur, social change and innovation.
Throughout the article you can see that the concept of social entrepreneurship is poorly defined and there are several perspectives about the same.
Keywords: social entrepreneurship, social entrepreneur, social change and innovation.
Introdução
“Os empreendedores
sociais não se contentam em dar o peixe e/ou ensiná-lo a pescar. Eles não
descansam enquanto não revolucionam a indústria do peixe”.
(Drayton, 2006).
O empreendedorismo social ou a atividade empresarial
com fins sociais tem vindo a aumentar nas últimas décadas (Austin et al.,
2006). Com efeito, este conceito é relativamente recente, existindo imensas
questões por explorar. Num Mundo emergido em dinamismos brutais, onde o risco e
a incerteza, bem como os desafios permanentes colocam os indivíduos em
situações de desconforto social, sendo, por exemplo, a pobreza um desses mesmos
riscos é imperativo existir novas soluções, apoiadas em inovações de modo a
existir uma maior coesão e equidade sociais.
O
presente artigo tem como propósito abordar a temática do empreendedorismo
social, através da sua contextualização, definição e apresentação das
diferenças com o empreendedorismo tradicional.
Os pontos a abordar passam por uma descrição da
emergência do empreendedorismo social, para que se possa contextualizar o seu
surgimento e em que condições apareceu na literatura e, essencialmente, na
prática, isto é, apoiados em casos reais. Posteriormente, passa-se á definição
do conceito de empreendedorismo social e, consequentemente, à apresentação de
várias perspetivas de quem é o/a empreendedor/a social. Os empreendedores
sociais descobriram ou criaram novas oportunidades através do processo de
exploração, inovação, experimentação e mobilização de recursos. Os
empreendedores sociais necessitam de continuar com as suas visões de futuro,
persuadindo financiadores para investir nas suas ideias e mobilizar as pessoas
a despenderem tempo e competências nos seus projetos (Dees, 2007; Wallace, 2007). Neste sentido, o empreendedor social
é alguém carismático e influente na sua comunidade ou até mesmo a uma escala
mais alargada. De seguida, apresenta-se, sumariamente, as diferenças e
semelhanças entre o empreendedorismo tradicional e o empreendedorismo social,
uma vez que existem imensas perspetivas relativamente a este assunto. Embora
sejam conceitos diferentes, apresentam algo em comum.
Na parte final do artigo é efetuada uma pequena
conclusão onde se apontam algumas reflexões inerentes ao empreendedorismo
social.
Emergência do Empreendedorismo Social
O
conceito de empreendedorismo tem sido debatido há imenso tempo no âmago dos
negócios e riscos económicos. Porém, na atualidade, tem sido largamente
aplicado ao contexto social e á resolução dos seus problemas (Dees, 1998a;
1998b; Thake e Zadek, 1997; Emerson e Twersky, 1986). O empreendedorismo social emergiu nos inícios dos
anos 80 a partir dos trabalhos de Bill Drayton, na Ashoka, e Ed Skloot. O
primeiro financiou inúmeros projetos de inovadores sociais espalhados pelo
Mundo. O segundo apoiou novos empreendimentos que, consequentemente, ajudou
empresas não lucrativas a explorar novas fontes de receita. Mais recentemente,
Muhammad Yunus alertou para a proeminência do conceito de empreendedorismo
social quando foi premiado com o Prémio Nobel da Paz por ter criado o Grameen Bank no Bangladesh (Smith e
Nemetz, 2009). Este foi um projeto (ideia) repleta de inovação que tornou
possível o financiamento de pequenas ideias de negócios. Contudo sem o
microcrédito seriam inviáveis e inexequíveis.
De acordo com Stryjan (2006) e Weerawardena e Mort
(2007), o empreendedorismo social é visto como uma emergência, sendo que a sua
definição é baseada num conceito coletivo e decorrente das práticas
desenvolvidas. Com efeito, depreende-se que as intervenções, baseadas no
empreendedorismo social, visam refletir-se em grandes grupos de pessoas.
Paralelamente, a definição do conceito foca projetos desenvolvidos para obter
maior coerência e pragmatismo.
O conceito é recente, mas muito em voga e traduz-se
numa das inovações contemporâneas capaz de resolver problemáticas sociais que,
por sua vez, são muito exigentes e desafiantes. Em consequência de no campo
académico ser um conceito relativamente novo é, ainda, imaturo e com falhas
profundas (Dees e Anderson, 2006), mas muito rico e com possibilidades de ser
explorado com linhas de investigação muito interessantes.
O Empreendedorismo Social
Para muitos autores o empreendedorismo social é um
conceito mal definido (Weerawardena e Mort, 2006: 21). Até à data, a literatura que aborda a temática do empreendedorismo
social tem sido limitada à descrição de estudos de caso, focados na sua
definição que assim descuraram a construção de uma teoria (Harding, 2004).
O
empreendedorismo social envolve transformações sociais gerando, para tal,
ideias de novos produtos e serviços (Schwab, 2008). Nesta abordagem incluem-se
negócios que tenham como principal preocupação objetivos sociais e que realizam
um enorme investimento dos seus proveitos em prol da comunidade (Morris, 2007).
Segundo
Austin, Stephenson e Wei-Skillern (2006) o empreendedorismo social é sinónimo
de inovação, criando valor social nas
atividade que podem ser desenvolvidas dentro ou fora do setor não lucrativo,
empresarial e do estado.
De acordo com Smith e Nemetz (2009), existem duas
grandes abordagens relativamente ao empreendedorismo social. A primeira foca-se
nas intenções e resultados (Alvord et al., 2004). A segunda nas oportunidades e
necessidades como adaptação à realidade das empresas sociais (Vyakaraman et al.,
1997). Na primeira abordagem, a tónica do conceito assenta na inovação para a
resolução de problemas sociais persistentes, tais como a pobreza e a
marginalização que, em alguns casos, tem tido muito sucesso como fator
impulsionador e catalisador da transformação social. Paralelamente, no lado
mais pragmático, a Schwab Foundation for
Social Entrepreneurship descreve o empreendedorismo social como a algo
prático, inovador e sustentável nas abordagens em benefício na sociedade em
geral, dando enfase aos pobres e marginalizados. Esta perspetiva indica que o
empreendedorismo social é uma abordagem única aos problemas sociais e
económicos porque é baseada em valores e processos que são transversais a cada
empreendedor social que olha para a sua sociedade ou organização (Schwab Foundation, 2008). Na segunda
abordagem é estabelecida uma comparação aos procedimentos do empreendedorismo
tradicional. Com efeito, é fundamental recorrer-se à inovação e experimentação
com base em necessidade/oportunidades detetadas na sociedade.
Contudo,
existem outras abordagens/perspetivas em torno da definição do conceito de
empreendedorismo social e seus objetivos. Por exemplo, alguns autores mantêm o
foco no empreendedorismo social como uma combinação comercial das empresas com
impacto social. Nesta perspetiva, os empreendedores usam o negócio, as suas
competências e conhecimentos para criar empresas que tenham objetivos com fins
sociais, ao invés de priorizar o sucesso comercial propriamente dito (Emerson e
Twersky, 1996). Evidencia-se, assim, que este tipo de organizações/indivíduos
visam, inequivocamente, ações com fins sociais. Com efeito, as organizações não
lucrativas podem criar subsidiárias e usa-las para gerar emprego ou reverter os
ganhos para causas sociais. No caso das organizações lucrativas, podem doar
alguns dos seus proveitos ou organizar as suas atividades para fins sociais.
Estas iniciativas integram recursos gerados pelo sucesso das atividades
comerciais que desenvolvem e sustentam as suas atividades sociais.
Outros,
ainda, colocam a enfase no empreendedorismo social como inovação para o impacto
social. Nesta perspetiva, a atenção centra-se na inovação e nas parcerias que
têm consequências positivas para a resolução dos problemas sociais, onde se
presta pouca atenção à viabilidade económica através de um critério de negócio
ordinário (Dees, 1998b). Os
empreendedores sociais estão focados nos problemas sociais e eles criam
iniciativas inovadoras, constroem novas parcerias sociais e mobilizam recursos
em resposta aos problemas, mais do que se dedicam ao mercado e a critérios
comerciais.
Por
fim, existem autores que vêm o empreendedorismo como uma forma de catalisar a
transformação social, enfrentando os problemas sociais e procurando soluções para
os mesmos. Nesta abordagem, o empreendedorismo social é preponderante para
produzir pequenas mudanças num curto prazo, refletindo-se através da existência
de sistemas catalisadores de grandes mudanças a longo prazo (Ashoka Foundation,
2000). O empreendedorismo social define-se, nesta abordagem, como algo
necessário, não só para os problemas imediatos e espontâneos, mas também para
os de longo prazo e mais complexos.
O Empreendedor/a Social
Bill
Drayton, CEO, chair and founder of Ashoka, a global nonprofit organization
devoted to developing the profession of social entrepreneurship (2006, p. 3).
Habitualmente são construídos modelos de
empreendedores/as sociais, sendo, inclusivamente, objetos de estudo. Não
obstante é fundamental obedecer a um certo rigor científico de modo a podermos
atribuir a alguém este estatuto. Com efeito, os empreendedores sociais são
“pessoas que intervêm onde detetam uma oportunidade para satisfazer ou
verificar uma necessidade onde é fundamental combinar recursos para dar seguimento
à sua resolução, uma vez que o sistema não consegue resolver todas as questões
de índole social” (Thompson et al., 2000).
No que respeita às suas qualidades, o empreendedor
social comporta um forte ímpeto ético, vontade de corrigir algo errado na
sociedade, desejo de se libertar, cruzar fronteiras disciplinares e a
capacidade de “trabalhar em silêncio” (Bornstein, 2007).
Em consequência deste comportamento e atitude, a motivação
para o empreendedorismo social é baseado no apoio a pessoas descriminadas e
negligenciadas, onde são necessários argumentos financeiros e políticos para se
perceber quais os benefícios para eles próprios (Martin e Osberg, 2007).
A Skoll
Foundation defende um empreendedorismo social através da concretização da sua
missão que se traduz “em defender uma mudança sistémica em benefício das
comunidades de todo o Mundo, através do interesse em contactar outros
empreendedores”. A Skoll indica que
“os empreendedores sociais são
líderes comprovados, cujas abordagens e soluções para os problemas sociais estão a promover a
melhoria de vida e as circunstâncias de
inúmeros indivíduos carentes ou desfavorecidos” (Skoll Foundation, 2008).
Existem, ainda, outras perspetivas relativamente à
caraterização do agente que empenha o empreendedorismo social. Bornstein (2004)
afirma que o empreendedor social tem ideias novas e poderosas, combina o seu
poder visionário e o Mundo real para assim resolver os seus problemas de forma
criativa, possuí uma forte ética e é totalmente possuído pela sua visão de
mudança. Já Ligth (2006) define o empreendedor social como um individuo, grupo,
Network, organização ou aliança de organizações que pretendem a sustentabilidade
e uma mudança em larga escala, através de ideias que representem uma quebra de
paradigma manifestadas pelo estado, empresas não lucrativas e lucrativas com o
objetivo de resolver os problemas sociais.
Como se observa, as perspetivas e o foco da definição
do conceito do que é, efetivamente, um/a empreendedor/a social são múltiplas.
Porém, importa reunir o máximo de contributos, no sentido tornar o conceito
mais robusto sob o ponto de vista científico.
Diferenças entre o empreendedorismo empresarial e o
empreendedorismo social
Joseph Schumpeter (1931) descreve o empreendedorismo
como a criação de uma nova combinação de recursos, através de atores discretos
que reformam e revolucionam os padrões de produção (questionam as rotinas).
Segundo
Alvord, Brown e Letts (2002) o
empreendedorismo na vertente tradicional visa a criação de negócios viáveis e
de crescimento. Em contrapartida, as metas do empreendedorismo social passam
pela mudança no sistema social que criam e mantêm o problema, embora as
organizações envolvidas possam tornar-se pequenas ou inviáveis para promover
essa mesma transformação social.
Uma nova perspetiva assenta na de Mallin e Finkle
(2007), que referem que o empreendedorismo social difere do empreendedorismo
tradicional na medida em que o empreendedor social é, por vezes, quem reconhece
o problema social e empenha os princípios do empreendedorismo para organizar,
criar e gerir o seu projeto de modo a produzir uma mudança social. De um modo
geral, transferindo para o conceito organizacional, existindo este tipo de
comportamento, as entidades tendem a ser não lucrativas, em conformidade com os
objetivos a que os empreendedores sociais se propõem.
Resumindo, o empreendedorismo empresarial centra-se
em criar riqueza e traduz-se numa forma clara de promover o desenvolvimento
económico, porém, o empreendedorismo social centra-se em tornar o Mundo num
local melhor (Cukier et al., 2011).
Para finalizar, importa referir que Dees e Anderson
(2006) sugerem que estas duas abordagens representam duas formas de pensamento
distintas. Contudo, afirmam que devem cooperar, não entrando em competição, de
modo a que o empreendedorismo social fique mais enriquecido.
Conclusão
O empreendedorismo social é um tema atual e que se
assume como uma das soluções para a resolução das problemáticas sociais. O
número crescente de organizações não-governamentais (ONG) é evidenciado pela The New Nonprofit Almanac and Desk Reference
(2002), referindo que houve
um aumento de 31% (1,2 milhões) em organizações
sem fins lucrativos, que superaram, de longe, o aumento de 26% em
formações de novos negócios. Reconhecendo
isso, o empreendedorismo social vem
ganhando crescente interesse na
literatura académica e no setor público
(Mallin e Finkle, 2007).
Relativamente ao conceito de empreendedorismo social
são múltiplas as definições e perspetivas. A inovação, o impacto social e a
transformação social são, entre outras, palavras de ordem e que estão
estritamente relacionadas com o empreendedorismo social. Todavia, importa
referir que o empreendedorismo social é, ainda, um conceito mal definido e que
não assenta na preocupação de formular uma teoria capaz de a sustentar
cientificamente.
No âmago na figura do empreendedor/a social é de
toda a importância referir que existe um grande número de
pessoas/organizações/instituições que definem outros tais como empreendedores
sociais. Não obstante o mérito das pessoas que apresentam trabalho no sentido
de resolver problemáticas sociais, não é conveniente generalizar e
despersonalizar o conceito. De modo geral, o empreendedor/a social empenha o
seu trabalho em prol de causas sociais, recorrendo aos seus conhecimentos e
competências para, de modo empreendedor e inovador, colmatar as necessidades
deixadas por um sistema cada vez menos protetor sob o ponto de vista social.
O olhar atento sobre os conceitos de empreendedorismo
e empreendedorismo social é demasiado importante para que se percebam as suas
diferenças e semelhanças. O empreendedorismo tradicional/comercial visa,
essencialmente, o lucro, enquanto o empreendedorismo social assume como
prioridade os fins sociais. Assim sendo, os princípios poderão até ser
semelhantes, mas o fim é diferente (ao nível das causas).
O empreendedorismo social é, hoje, mais do que um
conceito, uma prática levada a cabo por empresas lucrativas e não lucrativas.
Todavia, quando as iniciativas são várias para o mesmo fim, a consequência e a
causa defendida pode reduzir o seu impacto. É fundamental que o
empreendedorismo social não seja politizado e seja exercido de modo
desinteressado. Torna-se imperativo que as pessoas tenham competências na área
do empreendedorismo (social) para que possam redobrar as atenções, apresentando
soluções para os novos desafios que vão surgir, numa sociedade cada vez mais
dinâmica e imprevisível e onde o Estado Social é menos capaz de responder às necessidades
que se apresentam.
Artigos científicos consultados |
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Alvord,
S.; Brown, L. e Letts, C. (2004), “Social
Entrepreneurship and Societal Transformation: An Exploratory Study”, The
Journal of Applied Behavioral Science; Sep 2004; 40, 3; ABI/INFORM Globalpg.
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Content Analysis”, Journal of
Strategic Innovation and Sustainability, Vol. 7(1), pp. 99 – 119.
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Dees, J. G. (2001), “The meaning of “social
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Fuqua School of Business, Duke University, Durham, NC. Retrieved from:
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Mosher-Williams (Ed.), Research on Social Entrepreneurship: Understanding
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Smith, T. e Nemetz, P., (2009), "Social
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